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Sob o Domínio da Sombra: Mulheres, Bruxas ou Más?

Sob o Domínio da Sombra: Mulheres, Bruxas ou Más?

Sob o Domínio da Sombra: Mulheres, Bruxas ou Más?

Por séculos, as pessoas têm atribuído crimes à magia, em uma tentativa de acreditar que ações tão sombrias estão completamente fora dos limites do comportamento humano normal. Mas não estão.

Não é tão distante do imaginário do século XXI, associar crimes cometidos por mulheres à bruxaria. Devido ao mito da passividade feminina, as pessoas tendem a se utilizar de gatilhos para minimizar a violência feminina: desumanizá-las, comparando-as com feiticeiras, é uma delas. O medo, diante do poder de uma mulher precisa ter explicações quase paranormais.

E é sobre isso que vamos conversar hoje: mulheres más que, por seus crimes cometidos, foram tidas como bruxas, feiticeiras, amantes de demônios já que a sociedade tem embutida a misógina crença – referendada por Freud, aliás – de que a estrutura psíquica feminina é diferente da masculina. De novo, as mulheres não podem ser más e sim influenciáveis por demônios ou feitiços.

Elizabeth Bathory

Mas o que dizer de mulheres como Elizabeth Bathory, cujo nome inspirou muitas bandas de black metal? Essa condessa húngara, uma das primeiras criminosas em série documentadas na história, tornou-se conhecida por torturar e matar jovens meninas.  Para atenuar a ideia de uma assassina que mata apenas porque é uma assassina, a história se encarrega de dar ares surreais à condessa, impondo-lhe a pecha de bruxa e vampira.

Elizabeth Bathory

Elizabeth Ridgeway

Quando Elizabeth Ridgeway foi sentenciada a morte na fogueira, nos idos de 1684, como feiticeira, essa boa moça, criada em lar cristão, coloca seus crimes na conta de um “espirito familiar”, um demônio, que com ela se deitava e lhe sussurrava ao ouvido. Nossa doce Elizabeth envenenou vários maridos, pretendentes e desafetos.

Elizabeth Ridgeway

Tillie Klimek

Uma história um pouco mais recente, na década de 30 do século XX, temos a história de Tillie Klimek, que fez um possível total de vinte vítimas entre maridos e desafetos. Entre as acusações que pesaram sobre Tille está aquela onde ela é apontada como uma “Sacerdotisa” para cerca de vinte e oito mulheres que orientava como se livrar de seus rústicos companheiros. No julgamento, as mulheres tidas como seguidoras de Tillie, todas com boa aparência, foram absolvidas já que os juris, na época, eram simpáticos a qualquer sinal de abuso conjugal.  

Com a arraigada crença de que as mulheres estão essencialmente ligadas à sexualidade e por isso se tornam as agentes por excelência do demônio (olha aí as feiticeiras de novo!) nossa feia e desengonçada Tillie não consegue preencher os requisitos do pecado pela sexualidade, que é onde as mulheres tem mais conivência com o demônio. Enfim, as belas beldades foram liberadas já que sua aparência lhes conferia plena justificativa pela apaixonada violência de seus crimes. A feia Tillie foi a única condenada já que sua aparência, aos olhos da sociedade, deixavam a nu sua personalidade rancorosa e mesquinha.

Tillie Klimek

Como podemos perceber, os crimes cometidos por essas mulheres foram romantizados, demonizados, justificados de tal maneira a parecer que as mesmas não tinham controle sobre seus atos, isentando-as de certa forma, da responsabilidade por seus crimes. É uma forma clássica de calar e desumanizar essas mulheres. 

Essa visão de mundo não nos cabe. Mulheres podem ser essencialmente más sim! A maldade ou a sombra de nossa personalidade nos torna horrivelmente, inescapavelmente, humanas.

Ninguém se ilumina imaginando figuras de luz, mas se conscientizando da escuridão

Carl Jung

O arquétipo da sombra representa, de acordo com a psicologia analítica de Carl Jung, o “lado sombrio” da nossa personalidade. É o submundo conturbado da nossa psique que contém os nossos sentimentos mais primitivos, os egoísmos mais afiados, os instintos mais reprimidos e aquele “eu escondido” que a mente consciente rejeita e que nos mergulha nos abismos mais profundos do nosso ser.

A sombra pode nos tomar em várias formas. Às vezes ela se revela em comportamentos socialmente censuráveis, como perfeccionismo no julgamento, explosão de raiva, ciúme, ressentimento, ganância ou amargura. Pode se insinuar mais sutilmente, como na necessidade de ser notado, tendência ao isolamento ou inflexibilidade. Os aspectos da sombra podem ser censuráveis, mas podem ser também simplesmente fraquezas e ofensas. Tendem a surgir quando nos sentimos vulneráveis ou expostos e tentamos nos proteger. “A sombra, por natureza, é difícil de se compreender”, como apontam os psicólogos Connie Zweig e Jeremiah Abrams. “Ela é perigosa, confusa e sempre se esconde, como se a luz da consciência fosse roubar sua própria vida”

A vida nos oferece maravilhosas dádivas quando escolhemos enfrentar corajosamente nossa sombra. E por maravilhosas, quero dizer dolorosas, mas que valem a pena. Uma das grandes verdades da vida é que não se pode mudar o que não se conhece. Entretanto, uma vez que reconhecemos nossa sombra – tanto suas causas como suas expressões – seu poder sobre nós fica reduzido, senão eliminado.  Expor a sombra à luz é o primeiro e mais importante passo que precisamos dar para recebermos esta dádiva.

Morgana Leal.

Referências:

Lady Killers – Assassinas em série – Tori Telfer

O Martelo das Feiticeiras – Malleus Maleficarum

O Homem e seus Símbolos – Carl Jung

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