Cailleach e a Travessia do Inverno
Cailleach (pronunciamos cai-lâk) é uma poderosa Deusa, presente em muitos mitos da cultura celta e está intimamente associada ao inverno.
Em algumas narrativas, ela está ligada aos rochedos, às montanhas, sobre as quais pula batendo seu cajado na terra, trazendo o gelo, o frio e a neve.
Em outros registros míticos ela prende a Donzela da Primavera, representada pela Deusa Brigit, e ao final do Inverno Brigit se livra da gelada prisão de Cailleach.
Encontramos em algumas versões que Cailleach transforma-se na donzela Brigit para reinar durante a Primavera, ou que se transforma em pedra para que a renovação aconteça.
No entanto, em todas as versões podemos perceber que Cailleach tem um importante papel na mudança, na renovação e na transformação.
A Deusa Cailleach é representada por uma velha, com um grande cajado, às vezes com a pele azulada e os cabelos desgrenhados.
Uma visão que pode parecer assustadora, mas essa figura evoca o poder ancestral da terra, a sabedoria da velha que percorreu inúmeros invernos, pois Cailleach é a própria terra. Tanto a que germina, quanto aquela que recebe os mortos no tempo da partida.
E que lições Cailleach tem a nos ensinar?
O Inverno da Alma
Se olharmos atentamente podemos ver as características do inverno em diversos aspectos de nossas vidas: pessoal, emocional, psíquica, política e coletiva.
Em cada um deles existe o recolhimento, os momentos frios e escuros, o silêncio, a necessidade de estar abaixo da terra para se recarregar, a morte e a finalização de ciclos necessários.
Sendo Cailleach a representação do inverno, ela nos convida a termos esse momento de pausa, para olharmos para as situações que necessitam de renovação. Ou sobreviver ao inverno, ou encerrar um ciclo.
Se considerarmos o inverno pessoal, é a oportunidade que temos de sermos guiados por Cailleach no enfrentamento das nossas dores, feridas, em um percurso de aceitação na sabedoria da transformação.
Mas nós não estamos no inverno, certo?
Celebramos Ostara, Beltane e em breve chegaremos em Litha, o Solstício de Verão, então por que pensar no inverno se ele já passou?
Convido vocês a uma Reflexão
Olhem em volta. Não sei de que lugar estão lendo este texto, mas estou aqui em São Paulo, e hoje excepcionalmente escrevo em uma tarde de sol.
No entanto, o que observei ao longo desses meses foi um inverno persistente, difícil de terminar. Dias frios, chuvosos, escuros, totalmente avessos à primavera e ao calor tão desejado e festejado.
Bem, explicações temos muitas. Desmatamento, fenômenos meteorológicos, queimadas na Amazônia, no Pantanal, e por aí vai, a lista é enorme.
Mas me permiti olhar um pouco mais fundo. Talvez um puxão de Cailleach.
Se a cada mudança de estação podemos associar as transformações externas com as internas, o que será que esse inverno prolongado tem a nos dizer?
Que mensagens de Cailleach não foram ouvidas, elaboradas e aprendidas? Que preciosas lições deixamos passar e ficaram presas nas terras geladas de Cailleach, que relutam em liberar de uma vez por todas a Senhora da Primavera?
E não digo apenas no nosso âmbito pessoal, mas olhando para fora, para o entorno, para o todo.
A pandemia, a crise econômica, discursos negacionistas, posturas extremistas, o genocídio causado pela negação da ciência, a necropolítica que vivenciamos todos os dias, e mais tantas outras situações que poderia continuar citando interminavelmente. Então se façam outras perguntas:
- O que fazer com esse inverno coletivo, político e social que resiste em acabar?
- Cailleach insiste em nos mostrar, mas o que estamos perdendo de suas mensagens?
- O que é preciso deixar ir?
- O que é preciso transformar?
- O que é preciso nutrir?
- O que é preciso ressignificar?
A Espiritualidade da Deusa não está apenas nos feitiços e rituais. Também está na forma que conseguimos apurar nossos olhares para além do óbvio.
Que essas palavras encontrem o coração e a mente de quem precise!
Abençoades Sejam!
Que Cailleach nos Proteja!
Mariana Leal
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